domingo, 17 de junho de 2012

A curiosidade do gato, árvore de Zaqueu e a coluna da Praça de São Pedro


                                                                   



Foto: Jovens palestinos oferecem 'kefyieh' ao Papa


Roma, a Cidade eterna, berço de cultura, de imponente arquitetura, do Direito e da Fé é, também, o símbolo da unidade e da comunhão dos cristãos católicos. É na Praça de São Pedro, Estado do Vaticano, que se esbarram turistas de diversas partes do mundo: peregrinos, devotos, turistas, agnósticos. Misturam-se muçulmanos, budistas, crentes e não crentes. A Praça de São Pedro é ponto de encontro de diversas etnias e culturas no coração da “velha Itália”. Quando paramos para observar as pessoas que a visitam conseguimos prontamente distingui-las e subitamente perceber os possíveis motivos que as trouxeram até ali.

Os sucessivos flashes fotográficos, um olhar de descaso, uma Ave-Maria e um Pai nosso, vão identificando e revelando suas reais motivações. Quando entre elas se escuta um grito como: “lá vem o Papa”, é impressionante! Subitamente as pessoas se movimentam, espremem, buscam identificar por onde o Papa passará e procuram o melhor ângulo para clicá-lo. Os olhos fixos num ponto, os crentes tentam se aproximar, os menos crentes procuram dar espaços aos mais crentes, e os não crentes guardam com atenção o movimento na Praça em direção ao Papa. Quando os portões interiores do Vaticano são abertos, e o Papa aparece escoltado pela Guarda Suíça, a multidão grita: “o Papa, o Papa, é o Papa”. São vozes em italiano, em francês, alemão, português, árabe, inglês. Gritam os filipinos, os latinos, os orientais. Bento XVI passa, acena, faz o sinal da cruz e prossegue. É impressionante como neste momento a unidade visível toma conta da Praça.

É verdade que estes olhares não simbolizam a fé. Não são necessariamente olhares de fé.  Não significa fidelidade e unidade com o Romano Pontífice. São olhares de curiosos, de críticos, de turistas. Mas, não se pode negar a intensidade dos olhares. É evidente que a curiosidade favorece a atenção, e a atenção, por sua vez, faz com que os olhos fiquem atentos, os ouvidos abertos e as pontas dos pés esticadas para melhor visualizar o fato. Naquele momento o movimento da curiosidade favorece a unidade entre turistas, crentes e não crentes.

Recordo que na primeira vez em que fui à Praça de São Pedro e aguardava com ansiedade a chegada do Papa, o que mais me chamou atenção foi uma senhora muçulmana, com véu, que se equilibrava sobre uma coluna para melhor fotografá-lo. Pensei comigo: “Quanta curiosidade e pouca fé”. Mas logo me veio à mente: “Que mal tem a curiosidade?” “Não foi pela curiosidade que Zaqueu subiu na árvore para ver Jesus passar?” “Por que essa mulher não poderia, em nome da mesma curiosidade, apoiar-se em um pilar para ver o Papa passar?” Diria uma pessoa mais crítica e de melhor bom senso: mas, o Papa não é Jesus. Claro que não! Não é, e nunca será! O que há de comum entre Zaqueu e esta mulher mulçumana não é a figura do Papa, mas sim, a curiosidade.

E, o que Deus é capaz de fazer a partir da curiosidade, somente Ele sabe. Com Zaqueu, fez abrir a porta de sua casa, preparar-lhe um jantar e devolver tudo aquilo que tinha extorquido dos mais pobres. O que a curiosidade poderia fazer com essa mulher? Bom, não sei! Talvez torná-la uma muçulmana melhor, mais fiel a seu credo, feliz, flexível, ecumênica. Talvez ele lhe pedisse uma estadia em sua casa, um lugar em sua mesquita, um jantar; uma kibada, uma kafta, uma esfiha. Não sabemos!

            Estar na Praça de São Pedro é ver a fé acontecer. É experimentar o sentido de unidade. É sentir as coisas da vida: a vaidade, a intriga, o poder, o limite humano.  Mas é também ver um sinal de unidade, de comunhão, de respeito e de fraternidade. Lá o humano e o divino se encontram. A instituição e o carisma. O pecado e a graça. A humanidade e a divindade. A fé e a curiosidade.  Alguns entram com a fé, outros com a curiosidade, e Deus, por si, tira proveito de ambos. Dizem as Escrituras que as prostitutas nos precederão no Reino dos Céus e, por que não, com elas, os curiosos? O ditado popular diz que “a curiosidade matou o gato”, pois sempre cai na armadilha.  Mas, no caso de Zaqueu – e de tantos curiosos, prefiro afirmar: Matou nada! Ela o converteu.